Por Yuri Simeon
Do Observatório da Alimentação Escolar (ÓAÊ)
A Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas (ALEAM) aprovou na última quarta-feira (23) a derrubada do veto feito pelo governador Wilson Lima (UNIÃO) ao projeto de lei (PL) nº 126/2023. O PL será promulgado pela ALEAM e proíbe a oferta e venda de embutidos, enlatados e bebidas artificiais no ambiente escolar da rede pública estadual de ensino do Amazonas. O PL foi apresentado em fevereiro de 2023, pelo deputado Wilker Barreto (Cidadania), e aprovado por unanimidade, antes de receber o veto do governador.
De acordo com Clodoaldo Pontes, sociólogo e presidente do Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional do Amazonas (CONSEA-AM), a medida é um importante passo na defesa da alimentação escolar saudável e ocorre em consonância com outras experiências para barrar os ultraprocessados na alimentação escolar.
“É muito importante o PL aprovado pelos deputados estaduais amazonenses. Coloca o estado do Amazonas no processo valoroso de atuação parlamentar com medidas legislativas para proibir o consumo de alimentos ultraprocessados, comprovadamente prejudiciais à saúde pública. Mostrando que estão alinhados às iniciativas e exemplos nacionais, como o PL no Rio de Janeiro e Niterói, e a resolução nº06/2020 do FNDE sobre o PNAE, o Guia Alimentar para a População Brasileira, o Guia Alimentar para as Crianças Brasileiras e o Guia Alimentar para os Povos Indígenas. Que priorizam a educação para o consumo de alimentos saudáveis e a segurança alimentar e nutricional no país”, descreve.
No projeto de lei são considerados “embutidos” os alimentos feitos com tripa animal ou artificial, recheados com carnes variadas e gordura, como salsichas, linguiças, salames, mortadelas, chouriços, entre outros. No caso dos “enlatados”, serão proibidos os alimentos enlatados, como conservas, incluindo os preservados em salmoura, em solução de sal e vinagre ou em óleo comestível. E no caso das “bebidas artificiais”, serão proibidas as bebidas com baixo valor nutricional, como refrigerantes, refrescos artificiais, bebidas e concentrados à base de xarope de guaraná ou de groselha, chás prontos para o consumo e outras bebidas similares.
Esses alimentos são exemplos de alimentos ultraprocessados, como aponta o Guia Alimentar da População Brasileira e a “classificação NOVA”. Eles contém sabores artificiais, conservantes, outros produtos industriais e altas taxas de açúcar e sódio. E são prejudiciais para a saúde humana, sobretudo a saúde infantil, acarretando doenças crônicas graves como diabetes, hipertensão arterial, depressão e câncer, além de gerar hábitos de consumo condicionados aos ultraprocessados.
Luana de Lima Cunha, nutricionista e assessora executiva e de pesquisa do Observatório da Alimentação Escolar (ÓAÊ), explica que o ideal para uma alimentação saudável e adequada é sempre priorizar alimentos in natura ou com o mínimo de processamento industrial. “A recomendação de ouro é descascar mais e desembalar menos”, sintetiza.
Para o presidente do Consea-AM, entre os principais pontos positivos da medida estão “a proibição do uso de alimentos ultraprocessados nos espaços de ofertas de refeições nas escolas públicas estaduais, não só no café e almoço dos estudantes, mas bem como nas cantinas e festas promovidas pelas escolas”. Além “da obrigação para que os gestores das escolas públicas assumam o compromisso de planejar processos educativos com a participação dos professores na divulgação do quanto é prejudicial o consumo de alimentos ultraprocessados à saúde dos estudantes”.
Ele acredita que a determinação também deverá inibir a venda de ambulantes em frente às escolas, pois o “PL proíbe o consumo de alimentos ultraprocessados nas escolas públicas estaduais”.
E destaca que esse avanço está dentro de um processo mais amplo de debates envolvendo diversas entidades e órgãos públicos como os Conselhos de Segurança Alimentar e Nutricional (Conseas) e o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN) para fortalecer “a produção de alimentos saudáveis e a defesa e proteção do território. Garantir a segurança da terra para os povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais produzirem os alimentos saudáveis para o consumo da população brasileira”.
Com isso, o “Amazonas deverá reunir a sociedade civil em audiência pública, ainda neste segundo semestre, para debater, estruturar e deliberar um manifesto público com proposições para a alimentação saudável no estado do Amazonas”, com a participação de órgãos públicos como o Ministério Público Federal (MPF), a Defensoria Pública da União (DPU), o Ministério Público de Contas, ministérios públicos estaduais e a Defensoria Pública do Estado do Amazonas (DPE).
Clodoaldo defende ser “preciso ampliar o diálogo com o parlamento, governo estadual e governos municipais sobre os investimentos na agricultura familiar, nas produções orgânica, agroecológica e da sociobiodiversidade como passos importantes para gerar renda a quem produz alimentos saudáveis, garantindo o acesso aos mercados institucionais”.
Ele aponta a necessidade de se colocar “a alimentação saudável como questão central para a qualidade de vida e saúde dos povos indígenas, quilombolas, comunidades tradicionais, estudantes e populações das periferias das cidades no estado do Amazonas”. E finaliza, “temos ainda um longo caminho neste processo coletivo pela produção e o consumo de alimentos saudáveis no Amazonas”.
A lei aguarda a promulgação do Legislativo estadual e entrará em vigor 60 dias após sua publicação. O descumprimento sujeitará fornecedores e prestadores de serviço à advertência e apreensão do material, além de multa de R$ 500 e cassação da licença de funcionamento após 3 reincidências.