Pesquisa revela a redução das compras da agricultura familiar para estudantes durante pandemia

Iniciativa do ÓAÊ mostra que agricultores que forneceram alimentos para o PNAE enfrentaram problemas como falta de compromisso do Estado em cumprir acordo, aumento de custos e desperdício de alimento

3 de dezembro de 2021 | Notícias

Aumento dos custos com a logística e entrega fracionada das embalagens para transporte de alimentos, irregularidade e falta de programação dos calendários para a entrega dos alimentos à escola. Esses foram alguns dos problemas apontados por agricultores e agricultoras que participaram da pesquisa Levanta Dados Agricultor/a, lançada nesta quinta-feira (2/12) pelo Observatório da Alimentação Escolar (ÓAÊ).

Dividido em dois blocos, o relatório apresenta o perfil das/dos agricultoras/es que responderam ao questionário sobre o acesso ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) ao longo dos anos de 2020 e 2021, englobando desde questões relacionadas à produção/distribuição, até os problemas ocasionados pelas intercorrências contratuais.

Ao todo, foram ouvidas/os 516 agricultoras/es de todas as cinco regiões do país, presentes em 321 municípios. Do total de respondentes, 109 se prontificaram a contribuir com a pesquisa, mas não se encontravam no recorte estabelecido, que contemplou as/os agricultoras/es que forneceram para o PNAE, ao menos uma vez, nos últimos três anos (2019 a 2021). Dessa forma, foram consideradas para análise 407 respostas válidas.

Dentre as/os respondentes (agricultoras e agricultoras que forneceram ao PNAE nos três anos anteriores à pandemia), 19% voltaram a fornecer alimentos ao PNAE apenas em 2021, 11% relataram que ainda não voltaram a vender para o Programa e os demais (58%) forneceram alimentos pelo menos uma vez entre 2020 e 2021. 

Sendo parte de uma estratégia mais ampla do ÓAÊ que visa ampliar a escuta, as narrativas e o diálogo com estudantes e suas famílias, agricultoras e agricultores familiares, produzindo subsídios para sensibilizar a sociedade em defesa de uma alimentação adequada e saudável no âmbito do PNAE, a pesquisa revela que, no universo pesquisado, durante a pandemia da Covid-19 o acesso das/os agricultoras/ es familiares ao programa foi prejudicado, por interrupções ou significativas reduções nas compras, pelo não cumprimento de contratos vigentes pelas gestões públicas locais, mesmo após a autorização dada pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para a compra de gêneros alimentícios com recursos do PNAE. 


Falta de compromisso

No que diz respeito aos contratos para o fornecimento de alimentos, 87% manifestaram ter contratos vigentes durante a pandemia. No entanto, dentre estes, cerca de 30% relatam que os contratos não estavam sendo cumpridos ou ainda estavam em fase de negociação. Os gráficos abaixo apresentam estes dados.

“O contrato foi feito com o agricultor, mas não fizeram a compra. O meu contrato era de 19.000, mas compraram só 3.000. E o meu investimento para produzir todos os alimentos? Eu perdi. Minha família teve um grande prejuízo.”

Oferta de alimentação saudável

Apesar das adversidades da pandemia. 62% dos respondentes forneceram até 5 toneladas de alimentos cada um, enquanto 11% informaram ter fornecido mais do que 50 toneladas de alimentos em 2020 e 2021.o que aponta, mesmo em um contexto bastante adverso, a potência da agricultura familiar no fornecimento para o PNAE. Hortaliças e frutas frescas corresponderam a 72% dos alimentos ofertados, seguidos de frutas e legumes minimamente processados (como compotas e, geleias,…), perfazendo 38% das entregas.

Desperdício versus engajamento

A interrupção ou significativa redução das compras teve como consequência o desperdício e perda da capacidade de planejamento da produção. Entre os respondentes da pesquisa, 81% afirmaram ter tido o planejamento de produção e colheita previstos para atender a demanda do PNAE comprometidos, 56% relataram ter sofrido com desperdícios em decorrência dessas interrupções nas compras e rompimento dos contratos. Como alternativa solidária, 78% dos agricultoras/es engajaram-se em iniciativas de doação de alimentos.

Com vontade política é possível

A pandemia alterou as dinâmicas de compras públicas e abastecimento popular, prejudicando as famílias que participam destes sistemas locais de abastecimento. Parcela significativa dos/as agricultores/as que participaram do estudo sofreu com a interrupção ou significativa redução das compras e descumprimento de contratos, o que comprometeu a renda das famílias. Os relatos revelam a preferência das prefeituras e governos estaduais por produtos industrializados, diminuição e irregularidade nas compras, mas também a possibilidade de soluções conjuntas quando se estabelece o diálogo entre as partes. 

Mesmo durante a pandemia, e com todos os desafios compartilhados entre agricultoras/es e poder público, milhares de toneladas de alimentos foram comprados, com a prevalência de alimentos saudáveis e não processados. O que mostra que quando há diálogo e vontade política, mesmo em tempos de pandemia e distribuição de cestas, é possível manter a compra direta e a distribuição de alimentos saudáveis. Acesse a pesquisa aqui.

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