Por Luana de Lima Cunha e Yuri Simeon
Do Observatório da Alimentação Escolar (ÓAÊ)
Mais de 800 conselheiras e conselheiros que atuam nos Conselhos de Alimentação Escolar (CAEs) pelo país todo, se reuniram no mês de julho no Rio de Janeiro (RJ) para o II Encontro Nacional dos Conselhos de Alimentação Escolar. A atividade também foi palco do lançamento nacional da publicação “Levanta Dados: Conselheiras/os”, com os resultados da Pesquisa “Conta Pra Gente Conselheira(o)”, que apresenta uma análise sobre os desafios identificados no controle social do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).
O encontro contou com mesas de debate, ao longo de dois dias, em que foram aprofundadas diversas questões sobre formas de garantir uma alimentação escolar nutricionalmente saudável e adequada, experiências de aquisição de alimentos da agricultura familiar, desafios e formas de realizar o controle social, o PNAE no contexto de povos tradicionais, educação alimentar e nutricional, entre outros assuntos.
Foto: Seeduc/RJ
A assessora executiva e de pesquisa do Observatório da Alimentação Escolar (ÓAÊ), Luana de Lima Cunha, participou do evento representando o ÓAÊ e destaca a importância deste diálogo proporcionado pela atividade junto ao lançamento dos resultados da pesquisa.
“O lançamento do Levanta Dados: Conselheiras/os durante o encontro propiciou aproximação com um dos objetivos do ÓAÊ, que é a ampliação da escuta e diálogo com os atores envolvidos no Programa Nacional de Alimentação Escolar. Foram dois dias de importantes discussões e fortalecimento da participação social na construção de políticas públicas. Ao todo foram distribuídos 900 impressos da pesquisa e pudemos confirmar junto a conselheiras e conselheiros a importância da pesquisa na geração de subsídios para a ação dos Conselhos de Alimentação Escolar”.
O que são os CAEs
Os CAEs são espaços de atuação para o controle social do PNAE, que devem estar obrigatoriamente presentes em todos os municípios e estados do país. Esses conselhos devem possuir em sua composição representantes do poder executivo, das entidades de trabalhadores da educação e discentes, de pais/mães ou responsáveis de estudantes, de representantes das entidades civis organizadas, além de representantes de povos indígenas e comunidades tradicionais – quando existem escolas com este perfil no município. Cada membro titular deverá ter um suplente do mesmo segmento e a renovação do conselho acontece por eleição a cada 4 anos.
Entre as funções do CAE, estão desde visitas às escolas do município e estado, análise dos cardápios escolares, reuniões com a comunidade escolar, apoio a atividades de formação sobre alimentação escolar, encaminhamento de denúncias de irregularidades no PNAE, a análise da prestação de contas do município/estado sobre o uso dos recursos repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), entre outras funções. Caso o CAE identifique irregularidades na execução do PNAE, sendo notificado, o FNDE pode intervir e até suspender o repasse dos recursos do PNAE.
Eliana Maciel é assessora técnica pedagógica no CAE estadual do Amapá. Ela atravessou o país, viajando mais de 2.700 km, para participar do Encontro Nacional realizado na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Ela destaca o trabalho do CAE em conjunto com outros colegiados, entidades e órgãos públicos.
“No ano passado nós proporcionamos capacitação para as cozinheiras escolares, proporcionamos capacitação para os conselheiros, buscamos parceria com o Tribunal de Contas da União e do Estado, procuramos parceria com o Senai. O Conselho Nacional de Segurança Alimentar (Consea) foi nosso parceiro. Nós buscamos sempre parceiros para colaborar com a gente, porque só ninguém trabalha. Tem que se ter parceria”, relata.
Em resposta à Pesquisa “Conta Pra Gente Conselheira(o)”, sobre a colaboração do CAE com outros conselhos, instituições, redes ou fóruns visando o fortalecimento do controle social do PNAE, 38% dos respondentes apontaram como parceiro o Conselho de Educação, 34% apontaram o Centro Colaborador em Alimentação e Nutrição Escolar (CECANE) e 27% apontaram o Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea).
Desafios na atuação dos CAEs
Michele Oliveira dos Santos é presidente do CAE estadual da Bahia e relata que um dos principais desafios para o controle social do PNAE é conciliar a função de conselheira, não remunerada, com as outras responsabilidades profissionais e do dia a dia. “O controle social é um trabalho voluntário e todo mundo tem dificuldades para poder se disponibilizar para aquilo, apesar de assumir a responsabilidade”, descreve.
Michele aponta a necessidade de existirem respaldos legais para que as conselheiras possam realizar o exercício da função. “A gente também não tem nada que obrigue o executivo, por exemplo, ou a uma empresa específica, a liberar esse conselheiro para realizar as suas atividades. Eu acredito que isso precisa ser legalmente organizado. Para que a participação popular de fato aconteça”, defende.
A presidente do CAE da Bahia analisa a falta de apoio do poder público. “O II Encontro Nacional de CAEs tem um papel importante de atualização. E há uma dificuldade, de fato, dos conselheiros virem à uma atividade como essa. Vir a esse tipo de atividade é também um processo de formação e muitas vezes o Poder Executivo não tem essa compreensão”.
O agrônomo Maurício Klemann vive na capital paulista e compõe o CAE estadual de São Paulo representando entidades da agricultura familiar. Para ele, apesar da importante participação de conselheiras e conselheiros de todo o Brasil, também é nítida a ausência de representantes de outras regiões do país.
“Muitos municípios acabam não conseguindo participar. Muitos estados acabam não trazendo conselheiros para cá por falta de apoio econômico do poder público. A capacitação dos conselheiros, principalmente a oportunidade deles estarem compartilhando suas ideias, as suas experiências locais com outros conselheiros. Participar do Encontro Nacional, como está acontecendo aqui agora, é uma forma de aprendizagem”.
Entrevistados pela Pesquisa “Conta Pra Gente Conselheira(o)” sobre as condições fornecidas pelo poder público para o exercício da função, 27,7% dos conselheiros disseram estar insatisfeitos ou muito insatisfeitos com as condições de transporte fornecido para as visitas às escolas dentro do próprio município e/ou estado, 27,1% estão insatisfeitos ou muito insatisfeitos com a infraestrutura e equipamentos de trabalho e 22,5% estão insatisfeitos ou muito insatisfeitos com as condições ou a falta de transparência de informações.
Percepções sobre os resultados da pesquisa
Elenilsa Gomes Ribeiro Pereira é presidente do CAE municipal de Rio das Ostras (RJ). Além de participar do encontro, ela também respondeu à pesquisa “Conta Pra Gente Conselheira(o)” e descreveu como usou a pesquisa para aperfeiçoar a atuação do CAE.
“Participei da pesquisa, respondi ela toda e percebi o quanto ela me ajudou nas minhas ações como presidente e como conselheira. Serviu de grande relevância para minha atuação frente ao conselho, que inclusive colaborou também para a gente realizar visitas nas unidades escolares com um olhar diferenciado”, defende.
De acordo com Elenilsa, o principal diferencial desta pesquisa foi o olhar voltado para o trabalho de controle social e as condições para os conselheiros exercerem sua função, o que inclui a capacitação. “A capacitação é fundamental. Está no nosso plano de ação incluir a capacitação, cumprida com rigor, seja online ou presencial”, enfatiza.
A presidente do CAE da Bahia, Michele, também destaca a importância da pesquisa para compreender quem faz o controle social do PNAE no Brasil e quais são os principais desafios. “A pesquisa, ela é fundamental até pra gente se entender, entender como está a participação do CAE e quem somos nós”, aponta.
Para o conselheiro Maurício, do CAE estadual de São Paulo, “os dados são bem reveladores e trazem um monte de informações importantes pra gente conseguir prever algumas coisas no futuro. Por exemplo, da própria forma e estratégia da atuação dos conselhos e, principalmente, quais são as principais dificuldades que existem dentro do contexto da alimentação escolar”.
Ele finaliza ressaltando a relevância e importância de mais pesquisas como essa para a atuação nos CAEs. “Agradecer por essa pesquisa de tamanha relevância. E que mais estudos como esse possam surgir para realmente orientar, trazer à luz os problemas e os desafios que a gente enfrenta. E dessa forma, a gente pensar numa superação para atender bem, o máximo possível de pessoas, de estudantes”, conclui.